A DENGUE E A RESPONSABILIDADE DO ESTADO.

Causam estranheza a passividade, a indiferença e a inércia do poder público diante da catástrofe que acomete Belo Horizonte e inúmeras cidades do interior de Minas Gerais. A proliferação dos casos de contaminação pelo vírus da dengue é alarmante.

A omissão do Estado é evidente, quando deixou de adotar políticas públicas preventivas e tornou patente a sua responsabilidade subjetiva, numa clara comprovação de que mais uma vez o serviço público foi mal prestado.

A ausência de organização e planejamento dos entes públicos culminou no desastre que lamentavelmente ora se presencia. A epidemia se alastra e o poder público "diagnostica" de forma errônea a "empurroterapia" de que a sociedade tem culpa. Ora, a explosão da doença por inépcia do poder público está apenas e de fato relacionada com as atribuições de serviços próprios da administração e não dos administrados.

A colaboração cívica do povo não remete à obrigação, posto que esta caiba, por essencialidade, aos órgãos públicos, sem delegação a particulares, mesmo porque exigem atos de império e medidas compulsórias.

As denúncias de que os números de casos são bem maiores do que os notificados coloca sob suspeita de que seja maior o já absurdo registro de morte que subiu 50% em uma semana. A subnotificação compromete os serviços da Vigilância Sanitária, que perde o norte da urgência que a calamidade requer. 

O artigo 196 da Constituição Federal dispõe de forma expressa que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos. Portanto, a dengue é decorrente da omissão do Estado e foi causada pela ausência de serviços essenciais de saúde pública e pela demora na implementação de programas de prevenção e combate ao mosquito.

Nesse sentido, a interpretação do parágrafo 6º, do art. 37 da Carta Magna, que por violação do dever jurídico responsabiliza o Poder Público pelo resultado danoso. Daí, a lamentar, ainda e também, as lúgubres brincadeiras de alguns que assim já dizem por aí: "...até que a dengue os separe". Ora, possível, mas, de fato, inaceitável.  

A responsabilidade das mortes que enlutaram as famílias mineiras é da União, do Estado e principalmente do Município, quando não por dolo, mas indesculpavelmente por negligência e omissão. A "faute du service", por óbvio, no sentido do ato omisso, coloca a Administração sob o crivo do Poder Judiciário, caracterizada a sua responsabilidade civil por deixar de agir na forma da lei. 

A superlotação das unidades hospitalares em decorrência da dengue, por um lado mostra a gravidade da situação causada pelo aedes aegypti e por outro externa o quão está despreparado o Estado para lidar com as questões sociais e de saúde da população. 

A crítica à postura estatal, na figura política do município de Belo Horizonte, pontualmente, para o caso da dengue, inicia no momento em que este deveria agir e se omitiu. Inerte, quedou diante da proliferação da epidemia. Num segundo instante, se mostrou desidioso nas suas funções, entregando o cidadão à sua própria sorte. Algumas ações frívolas ou tardias não amenizam a dor e nem trazem de volta os entes queridos que se foram.

A inoperância do município, qualquer que seja, frente da epidemia da dengue, deve por si, obrigatoriamente, sustentar e documentar a condenação de indenizações individuais, bem como vencer aproveitando o mesmo leito argumentativo, a esfera dos direitos coletivos, para resgatar a municipalidade do seu estado de letargia. 

Wilson Campos (Advogado / Consultor Jurídico). 

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de 22/03/2013, sexta-feira, pág. 23).


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